Com o golpe de uma pluma

Em bom espanhol, dizemos “de um plumazo” para nos referirmos à rapidez com que se toma uma decisão que deve ser confirmada por uma assinatura. Quando traduzimos para inglês, a frase seria “with the stroke of a pena” e, se regressarmos de forma esquemática e literal ao castelhano, ficamos com o título deste post “com o golpe de uma pena”, que é a via pela qual a União Americana de Liberdades Civis exige que o próximo presidente norte-americano encerre para sempre a infame prisão que esse país tem na base militar situada na baía de Guantánamo.

Os meus escrúpulos anti totalitários, alimentados pelo compreensível preconceito de que padece uma pessoa depois de sofrer uma ditadura de meio século, fazem com que disparem os meus alarmes ante esta petição. Assusta-me que alguém tenha tanto poder, inclusivamente para fazer i bem. Não sabem os senhores os plumazos que temos tido nestas latitudes e, ainda mais, os “telefonazos” e os “tribunazos”. Com o gesto de uma mão, saída da janela de um jipe soviético de quatro portas, arrasaram-se culturas, destituíram-se ministros e embaixadores, ordenou-se a construção de uma barragem, o cancelamento de um evento, o início de uma guerra, o envio de médicos para outros países, a censura de um livro, a abertura de muitas prisões… e o restante que não sabemos.

Mas às vezes o tempo aperta e temos de deixar para trás certos preconceitos. As instalações carcerárias deveriam estar permanentemente debaixo da observação dos órgãos competentes de justiça e não fora das fronteiras, isentas de controlo. O encerramento desta prisão é exigido por aqueles que vêem afectado o prestígio dos Estados Unidos e pelos que se preocupam sinceramente por qualquer atropelo que se cometa, com a independência dos que são atropelados e, desde logo, por nós também, que somos os verdadeiros donos da ilha, de toda a ilha.

Quando o Obama tiver a pena na mão (nem sequer tem de ser no primeiro dia no escritório oval), era bom que fosse para libertar o seu país da pesada carga desta ignomínia, ou para fazer justiça àqueles a quem tenham sido roubados os seus direitos; que alguém lhe mostre o mapa onde aparece Guantánamo e, de seguida, lhe diga que os cidadãos norte americanos não podem visitar o resto da ilha, que não é apenas a parte mais bonita, mas também a mais interessante; que alguém lhe explique que neste largo Caimão no meio do mar do Caribe há milhões de pessoas (dezenas de milhar, se se quiser ser moderado) que respiraram de alívio ao saberem que ele era o eleito. Pessoas que acreditam firmemente que ele tem uma oportunidade única e possivelmente irrepetível, não de desferir um “plumazo” para resolver os nossos problemas, mas de, com a suavidade de que é capaz uma pena, enviar uma mensagem. Fazer, mesmo assim, um gesto com a mão.

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