Vinte anos de liberdade ou o verdadeiro rosto de Fantomas

Ontem, quinta-feira, fiz uma festa para celebrar os 20 anos de ser um homem livre. Foi às 10h da manhã de 18 de Dezembro de 1988 que assisti a uma reunião onde me informaram que já não poderia exercer mais como jornalista oficial em Cuba. No pelotão de fuzilamento, onde fui executado como profissional de informação, dispararam sobre mim José R. Vidal (Cheito), director do Juventud Rebelde, Lázaro Barredo, da direcção nacional da UPEC (Unión de Periodistas de Cuba – União de Jornalistas de Cuba), Juan Contino, que nessa altura era o segundo secretário do Buró Nacional da UJC (Unión de Jóvenes Comunistas – União de Jovens Comunistas) e outros colegas do diário que só levavam balas de cortesia.

Acusaram-me de negar a obra do programa revolucionário, de exaltar as contradições entre a geração jovem e a que ocupava os cargos de direcção no país, e de usar termos ambíguos que propiciavam uma leitura dupla dos meus textos; acrescentaram alguns detalhes, como por exemplo, que tinha instigado um grupo de estudantes da escola de jornalismo para que fizessem uma provocação durante um encontro que tiveram com o Comandante-chefe e, para além disso, que me reunia em minha casa com jovens a quem inculcava ideias contrárias à revolução.

Defendi-me disto tudo com unhas e dentes numa longa e meticulosa apelação enviada a Carlos Aldana, que dirigia nessa altura o aparelho ideológico do Partido. Meses depois (acho que em Agosto de 1999), fui recebido na sede do Comité Central por um funcionário de apelido Castellanos, que era o segundo de Aldana e pró-Jacinto Granda, que já se preparava para assumir a direcção do Granma. Estava desejoso por ver como poderiam eles rebater aqueles argumentos que eu tinha alinhavado com tanto empenho durante longas e esgotantes jornadas de reflexão. Para minha surpresa, o Castellanos disse-me para eu não perder tempo em defender-me das acusações recebidas, que eu não podia continuar a ser jornalista simplesmente porque o meu pensamento se afastava da linha do partido e que era tudo.

Foi dessa forma que conheci o verdadeiro rosto de Fantomas. Saí daquele lugar furioso e frustrado porque ainda não tinha compreendido que a leveza que me embargava não se devia a ter-me transformado numa pessoa insignificante, mas sim porque me tinham convertido num homem livre.

Ontem à noite brindei àqueles que me livraram para sempre do penoso fardo da simulação. Juro que não lhes guardo nenhum rancor e agradeço-lhes publicamente o imenso favor que me fizeram.

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